segunda-feira, 28 de julho de 2014

ESTATUTO DO HOMEM - Thiago de Mello (Ato Institucional Permanente)


Artigo I 

Fica decretado que agora vale a verdade. 
agora vale a vida, 
e de mãos dadas, 
marcharemos todos pela vida verdadeira. 


Artigo II

Fica decretado que todos os dias da semana, 
inclusive as terças-feiras mais cinzentas, 
têm direito a converter-se em manhãs de domingo. 


Artigo III 

Fica decretado que, a partir deste instante, 
haverá girassóis em todas as janelas, 
que os girassóis terão direito 
a abrir-se dentro da sombra; 
e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro, 
abertas para o verde onde cresce a esperança. 


Artigo IV 

Fica decretado que o homem 
não precisará nunca mais 
duvidar do homem. 
Que o homem confiará no homem 
como a palmeira confia no vento, 
como o vento confia no ar, 
como o ar confia no campo azul do céu.


Parágrafo único: 

O homem, confiará no homem 
como um menino confia em outro menino. 


Artigo V 

Fica decretado que os homens 
estão livres do jugo da mentira. 
Nunca mais será preciso usar 
a couraça do silêncio 
nem a armadura de palavras. 
O homem se sentará à mesa 
com seu olhar limpo 
porque a verdade passará a ser servida 
antes da sobremesa. 


Artigo VI 

Fica estabelecida, durante dez séculos, 
a prática sonhada pelo profeta Isaías, 
e o lobo e o cordeiro pastarão juntos 
e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora. 


Artigo VII

Por decreto irrevogável fica estabelecido 
o reinado permanente da justiça e da claridade, 
e a alegria será uma bandeira generosa 
para sempre desfraldada na alma do povo. 


Artigo VIII 

Fica decretado que a maior dor 
sempre foi e será sempre 
não poder dar-se amor a quem se ama 
e saber que é a água 
que dá à planta o milagre da flor. 


Artigo IX

Fica permitido que o pão de cada dia 
tenha no homem o sinal de seu suor. 
Mas que sobretudo tenha 
sempre o quente sabor da ternura. 


Artigo X

Fica permitido a qualquer pessoa, 
qualquer hora da vida, 
o uso do traje branco. 


Artigo XI 

Fica decretado, por definição, 
que o homem é um animal que ama 
e que por isso é belo, 
muito mais belo que a estrela da manhã. 


Artigo XII 

Decreta-se que nada será obrigado 
nem proibido, 
tudo será permitido, 
inclusive brincar com os rinocerontes 
e caminhar pelas tardes 
com uma imensa begônia na lapela.


Parágrafo único: 

Só uma coisa fica proibida: 
amar sem amor. 


Artigo XIII 

Fica decretado que o dinheiro 
não poderá nunca mais comprar 
o sol das manhãs vindouras. 
Expulso do grande baú do medo, 
o dinheiro se transformará em uma espada fraternal 
para defender o direito de cantar 
e a festa do dia que chegou. 


Artigo Final. 

Fica proibido o uso da palavra liberdade, 
a qual será suprimida dos dicionários 
e do pântano enganoso das bocas. 
A partir deste instante 
a liberdade será algo vivo e transparente 
como um fogo ou um rio, 
e a sua morada será sempre 
o coração do homem.

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